Tuesday, April 26, 2005

24. O perigo chinês

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Têxteis chineses: até Setembro não serão accionadas as cláusulas de salvaguarda
O comissário europeu do Comércio, Peter Mandelson, anunciou esta sexta-feira, que vai recomendar, na próxima semana, à Comissão, a abertura de inquéritos sobre a importação de certas categorias de produtos têxteis chineses, um primeiro passo rumo ao recurso às cláusulas de salvaguarda.Em função das regras seguidas pela Comissão, as cláusulas de salvaguarda contra as importações chinesas só podem ser activadas em Setembro. (…)
Euronews -> desenvolvimento da notícia


Portugal pede urgência para proteger têxteis
Portugal vai pedir formalmente à Comissão Europeia que acelere o processo de investigação ao aumento das importações têxteis chinesas. Uma posição que foi comunicada ao comissário europeu do Comércio no domingo, mas que Peter Mandelson não quis entender como oficial, tendo ontem o seu porta-voz anunciado que aguardavam, ainda, um pedido formal para poder actuar. (…)
Diário de Notícias - > desenvolvimento da notícia

Caso a Europa tome medidas para limitar exportações de têxteis chineses

Pequim adverte UE para degradação das relações comerciais bilaterais

A China advertiu hoje a União Europeia para os riscos de degradação das relações comerciais bilaterais se a UE tomar medidas para limitar as exportações de têxteis chineses.
"Esperamos que UE esteja consciente do impacte negativo que esta decisão teria", alertou o porta-voz do Ministério do Comércio, Chong Quan, num comunicado colocado no site daquele departamento governamental chinês."Esperamos que a UE se abstenha de influenciar o comércio bilateral através de medidas unilaterais", acrescentou Ching. (…)

Público - > desenvolvimento da notícia



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Sem dúvida que é de grande complexidade e melindre esta questão dos têxteis. Muita gente depende desta indústria e os preços, proibitivos por um lado, ao valor da chuva em Abril – em tempo normal - por outro, fatalmente que terão que provocar um conflito de interesses que, embora de enormes proporções por tudo quanto está em jogo, se espera que a diplomacia evite que degenere em algo mais grave do que simples trocas de acusações.

Concorrência desleal!, grita-se de uns das barricadas. Com alguma razão, pois que, em termos económicos gerais, aos países em que os direitos humanos – particularmente das crianças – no que respeita às questões laborais – são mais respeitados, torna-se extremamente difícil a concorrência em preços com regiões do Globo onde tais preocupações sociais não existem.

Temos que fazer pela vida!, proclama-se da outra parte. O que também é verdade. A Europa e os USA não podem esperar que o Terceiro Mundo continue a deixar-se subjugar aos ditames dos países desenvolvidos.

É preciso não esquecer que o avanço desenvolvimentista “ocidental” quase sempre se ficou a dever à exploração da mão de obra barata do referido Terceiro Mundo. Daí que se torne um tanto hipócrita clamar-se contra aquilo que ontem quem agora se sente lesado praticou por tanto tempo.

Trata-se, no entanto, e de ambos os lados, de uma questão em que está em jogo a sobrevivência de milhões de pessoas. Trata-se, pois, de uma assunto muito sério, que não admite distracções nem laxismos.

Por parte do cidadão comum, de que não passo, que do assunto apenas sabe o que vai seguindo através das notícias que vão chegando de vários cantos do mundo, do seu próprio principalmente, parece que uma solução negociada – que é imperioso que se alcance – terá que, como sempre, passar por algumas cedências de parte a parte.

Por um lado, da parte do Terceiro Mundo, por um abrandamento do desrespeito pelos Direitos Humanos, no que respeita à exploração da mão de obra de miséria – com especial realce, reafirmo, das crianças, trabalhadoras de escravatura das mais duras - de modo a que se não inundem os mercados com têxteis ao preço da chuva; por outro, pelo apelo aos países mais desenvolvidos, no sentido de que usem das suas melhores capacidades técnicas para uma reconversão capaz de, fornecendo artigos de qualidade superior, não ficarem tão reféns da capacidade oriental de produzir em quantidade e preço tais que tudo derrubam à sua passagem.

Está dado, pois, o lugar à diplomacia. Esperemos que funcione.

No entanto, algo causa apreensão quanto à capacidade – portuguesa, mas, pelos vistos, não apenas portuguesa – de encarar de frente esta questão, tentando resolvê-la pela melhor forma possível e com um mínimo de sobressalto.

É que, como afirmou o ministro do Comércio chinês, Bo Xilai, "A China não é a principal responsável pelo fenómeno dos aumentos brutais de exportações têxteis em alguns mercados", tendo acrescentado que ele “se deve às medidas proteccionistas que os países mantiveram durante dez anos, antes do levantamento das quotas pelos países importadores”.


Ora, sabemos que isto tem sido uma realidade, embota talvez aqui não esteja a verdade toda, como é normal que não esteja, já que numa confrontação, a razão jamais está apenas de um lado. No entanto, esta alegação será das mais fortes, seguramente. É que os países que ora se lamentam, parecem ter preferido acantonar-se nos seus redutos defensivos, com medidas proteccionistas que se sabe que um dia terão forçosamente que acabar, em vez de terem passado ao ataque, avançando na senda do desenvolvimento, até por uma questão de solidariedade universal.

Ora, esta atitude proteccionista, para mais tomada por países que se proclamam acérrimos defensores do comércio livre, no mínimo parece com um contrasenso insanável e mesmo algo inquietante.

Uma coisa é certa, também. A uma situação de conflito de interesses avançada como esta se encontra nunca ninguém chega só. É dos livros.

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Sunday, April 17, 2005

23. Limitação dos mandatos políticos – mito a destruir

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O Prof. David Justino, que não me canso de ler, aborda, no 4R-Quarta República, a questão da limitação dos mandatos políticos. Trata-se de assunto que me suscita grande interesse, porque muito sobre o assunto se tem dito, a maior parte das vezes, sem os cuidados e clareza necessários. Que não é o caso de D. Justino, diga-se em abono da verdade.

Estive para lhe responder lá mesmo. Atendendo, porém, a que se trata de comentário extenso, entendi por bem trazê-lo para os meus domínios, assim não abusando da paciência com que ali tenho sido acolhido. Não evitarei, contudo, a referência ao inspirador deste post nem deixarei de nele inserir o link adequado e necessário. Cortesias a que se obriga quem vive em sociedade e assim gosta de continuar.

A limitação dos mandatos políticos parece-me – sem pretender melindrar seja quem for, questão verdadeiramente bizantina. Sou radicalmente contra a sua mera enunciação.
O argumento do caciquismo e da corrupção são, quanto a mim, ambos falaciosos, apenas servindo para deitar poeira nos olhos dos incautos… mas apenas dos mais incautos.

Na maior parte dos casos em que se argumenta nesse sentido, faz-se por mera e circunstancial demagogia. Quando, por qualquer motivo – fútil quase de certeza - deixar de ser agradável aos ouvidos de muitos cidadãos incautos e pouco informados ou menos habituados a ler nas entrelinhas, ninguém mais cuidará do assunto, se preocupará em desalojar, por meios coercivo-administrativos quem os eleitores querem que no poder permaneça, seja porque faz trabalho que agrada, seja porque tens olhos azuis ou é engenheiro hidráulico.

Sou da opinião de que, uma vez instalado na cadeira do poder – qualquer que ele seja – um cidadão só de lá deve ser apeado por vontade própria - sem mais ademanes - ou alheia, do eleitorado, desde que expressa, manifestada em votação regular e sem a mácula da batota. Tudo o que não se contenha dentro desta baliza, deixa de corresponder ao espírito democrático que todos dizemos prosseguir.

Mais: nem com a limitação - que actualmente se verifica – dos mandatos presidenciais posso estar de acordo. E sou mesmo a supor que estará comigo, quem tenha vindo a prestar boa atenção aos desempenhos presidenciais dos vários titulares que já pelo cargo passaram. Porque, certamente, terá visto esta coisa singular e perversa – hipócrita mesmo (há que não recear chamar os bois pelos nomes) – de assistir a um primeiro mandato muito cordato e a um segundo completamente desestabilizador e com tendências verdadeiramente assassinas.

Ora, esta situação subverte por completo tudo quanto as boas e piedosas almas constituintes quiseram prevenir.

O que temos visto, invariavelmente visto, com expressão máxima no ex-presidente Soares e boa acentuação no actual, Sampaio, mais não tem sido do que a versão de cada um de uma mesma teoria político-circunstancial de benefício dos correlegionários de cada um. Esta é a verdade nua e crua e tentar tapá-la com o manto diáfano da fantasia, de bacoca fantasia não passa.

Tal como Mário Soares, Jorge Sampaio teve um primeiro mandato cordato, abrangente, que a todos – ou quase – quis satisfazer e foi satisfazendo; tal como Mário Soares, Jorge Sampaio teve um segundo mandato em que desfez tudo quanto antes construíra. Tudo sob forte premeditação.

Cabe, então, perguntar:

- Quando é que um e outro foram verdadeiros, eles próprios, defendendo os interesses gerais do país e não os particulares, da sua facção política?

- E quando é que, por contraposição, optaram pela hipocrisia política, para agradarem a todos, desagradando o menos possível, com os olhos postos na renovação do mandato?

Mais ainda:

- Quando é que o País beneficiou do seu comportamento político-presidencial e quando é que foi altamente prejudicado, num caso e noutro, por terem sido privilegiados os interesses particulares, de facção, e não os gerais, do País?

E não se pense que escrevo isto, estribado na circunstância de se tratar de dois políticos que não são da minha cor. Não. Solenemente o afirmo aqui, para que fique registado, que estou plenamente convicto de que, no caso de Cavaco Silva vir a ser eleito PR, com ele as coisas seguirão por caminho semelhante.

E estou mesmo em crer que tudo será ainda pior, uma vez que entendo que Cavaco, economista que é, primeiro-ministro que foi, político de excepção que ainda se julga, não resistirá à tentação de, de forma continuada, interferir directamente nos aspectos económicos da governação, atrevimento que Soares nesse âmbito não teve, mas apenas porque em Economia e estudo de dossiers sabe-se como as coisas funcionavam…

O que acima fica referido não se passaria, por certo, se não houvesse a tal limitação de mandatos. O titular do cargo na Presidência da República, já não ameaçado de sair no final do segundo mandato, não se sentiria tentado a dificultar a vida ao executivo, por receio de que o eleitorado lhe dificultasse a dele próprio.

Ora, se o que se pretende é melhorar a qualidade da democracia portuguesa, julgo que a medida a tomar não passa pela limitação de qualquer mandato, que isso, no limite, é pura autocracia legal, mas, sim, pela melhoria das condições de remuneração – e não apenas essas – dos diversos titulares de cargos políticos.

É que a qualidade dos pretendentes tem vindo a baixar porque – sejamos claros e, acima de tudo, realistas! – qualquer quadro médio de empresa privada média aufere maior vencimento e mordomias do que um titular de cargo político a qualquer nível, incluindo o Presidente da República.

Nestas condições, não é de causar qualquer tipo de espanto que os melhores - por mais preparados - de entre os portugueses, fujam dos corredores políticos a sete pés, não querendo assumir responsabilidades que não são devidamente recompensadas nem misturar-se com gente que, nada mais sabendo fazer, envereda por uma carreira política, por ter a nítida percepção de que, não dispondo de qualquer experiência de vida concreta - empresarial ou outra - jamais vingaria “cá fora”. E assim se vai deteriorando a classe política e a vida política, o país político que temos, a comunidade portuguesa acantonada no rectângulo e regiões autónomas. Com algumas excepções, apenas confirmativas da regra.

Não é, como bem sabemos, verdade que até mesmo a chefe de governo chegaram pessoas que jamais exerceram uma profissão? Jamais pagaram um salário? Jamais estudaram um relatório e contas, de empresa, por mais modesta que fosse? Jamais olharam um livro “Razão”? Que espécie de preparação tem gente assim? Que garantias concretas de um real bom desempenho do cargo pode oferecer? Como queremos, nesta conformidade, que a classe política seja considerada e respeitada como merece?

Ora, V. que tem a paciência de me ler, faça um pequeno esforço e interiorize a ideia de que é um quadro bem remunerado – ao nível das boas empresas privadas, mesmo portuguesas – e igualmente bem mordomiado. Em semelhantes circunstâncias, dispunha-se a tudo largar para se ir meter nos escusos corredores da política, tal como a praticada em Portugal, apenas pelo fogo fátuo de narcisismo pouco inteligente? Ora, pense bem no assunto. E mais: pense no que lhe diria a família mais chegada, mulher e filhos, se, não obstante os contras que encontrasse, persistisse na peregrina ideia de seguir em frente?

Por outro lado, a preocupação com a dificuldade em apear os “dinossauros” apenas pode provocar risada. Enorme, descontrolada e certamente esganiçada risada. É que essa é a mais falaciosa das falácias... Na verdade, é perfeitamente entendível que qualquer “dinossauro” – que não significa incompetente ou corrupto ou incapaz, é preciso que se esclareça, por via das dúvidas – apenas o será enquanto o eleitorado quiser. E o eleitorado, em democracia, não é burro nem limitado, nem sequer constrangido. Afirmações desse teor feitas por pretendentes preteridos apenas se destinam a mascarar incapacidades próprias. Quem duvida disto não acredita nas virtudes da democracia e, então, é melhor dizê-lo frontalmente, sem perífrases, circunlóquios.

Faça-se, pois, o que se deve fazer, e acabe-se, de uma vez por todas, com canhestros sofismas, que apenas enleiam cidadãos incapazes de um simples e escorreito juízo crítico. Sim, digo bem, incapazes. Mas somente até que se lhes explique o que deve ser explicado, com um mínimo de seriedade e desejo de tudo deixar no são. Porque de burros nada têm. Queiram os iluminados que assim seja ou não queiram. Coisas da democracia!...
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Wednesday, April 13, 2005

22. "Danou-se, cara, danou-se!..."

Acaba de ser inaugurado um novo estilo de blog, o blog da Anesul.

Um estilo em que, não já um simples e descuidado cidadão a nível individual, mas antes uma poderosa associação, usa aquela forma de comunicação com as massas para, sob a forma panfletária – que, infelizmente, tem vindo a perder-se entre nós, porque, afinal, é da discussão directa e frontal, límpida, transparente, que nasce a luz que supostamente a todos há-de iluminar… – meter, como é uso dizer-se, a “boca no trombone” e proclamar aos quatro ventos que algo corre mal uns bons paralelos a sul do “reino da Dinamarca”.

Ora, aquele blog dá a conhecer que, sob o título Porto de Setúbal – mudança de rumo impõe-se, publicou a Anesul, mais extensamente conhecida por Associação dos Agentes de Navegação e Empresas Operadoras Portuárias, um suplemento à edição do jornal Semmais, de 24 Março último, no qual começa por dizer:

"NA SEQUÊNCIA de uma desesperada estratégia de marketing político, a Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra - APSS, S.A., tem vindo a insinuar-se junto da opinião pública e dos órgãos de poder, através da publicação, em diversos órgãos da comunicação social (local, generalista e especializada), de notícias que visam a apresentação do porto de Setúbal como um el dorado onde tudo corre às mil maravilhas, mas que, para os observadores mais atentos, outra finalidade não terá que não seja uma derradeira tentativa de conseguir a manutenção de cargos, na era pós 20 de Fevereiro de 2005”. (…)

É. A Anesul não faz a coisa por menos!

Segue-se um texto de oito páginas, profusamente ilustrado com gráficos, quadros e fotos do Porto de Setúbal (o tal que constitui certamente o mais grave atentado cometido contra a cidade nos últimos 15/20 anos, por parte do Estado, sem que os responsáveis autárquicos tivessem tomado a posição a que estavam obrigados, ou seja, defender os interesses dos munícipes e da cidade até às últimas consequências… mas isso será tema a trazer à liça noutra oportunidade…), em que a Associação dos Agentes de Navegação visa fundamentar a razão que assevera assistir-lhe, levando a “cacha” tiradas como:

.....- APSS optou claramente pela via da transformação de um mercado concorrencial num monopólio.
.....
- APSS acabou por assinar os contratos de concessão em 16 de Julho de 2004, num momento de vazio político
.....
- Perante a análise dos factos, o que se verifica é que o movimento do porto retrocede nas áreas concessionadas.
.....
- Aumento generalizado dos custos de utilização do porto de Setúbal; perda acentuada de produtividade nas operações portuárias
.....
- APSS tem contribuído de uma forma negativa para que o porto se torne cada vez menos competitivo.
.....- As perdas de 20% na produtividade obrigam os armadores a escolher alternativas ao Porto de Setúbal.
.....- Cargas tradicionais do porto de Setúbal são agravadas nos seus custos de movimentação portuária em valores que variam entre os 1.500% e os 40%.

É, sim. A Anesul não faz a coisa por menos!

Termina o documento com uma nota final, que se transcreve nas partes mais significativas:

É esta, pois, a realidade actual do porto de Setúbal. Uma realidade bem diferente daquela que a APSS, já a braços com as consequênciasz negativas da política que delineou para as concessões no porto de Setúbal, pretende fazer passar para a opinião pública e para o governo, através da comunicação social.

Uma realidade que a ANESUL não pode deixar de denunciar sob pena de (…) agravar irremediavelmente a situação do porto (…) Uma realidade que motivou já diversas queixas nos tribunais portugueses e nas instâncias comunitárias competentes (…) Uma realidade que originou já a perda de diversas cargas e tráfegos (…) Daí que a ANESUL não possa deixar de concluir que o Porto de Setúbal necessita de uma mudança de rumo a vários níveis. (...)

É mesmo, caramba! A Anesul não faz a coisa por menos!

Isto posto, não causaria admiração por aí além que tivessem começado já a movimentar-se interesses vários e até mesmo sido posto a correr pela cidade abaixo-assinado "recomendando" a recondução dos órgãos dirigentes da APSS.

Como se calcula, perante tal estado de coisas, é funda a ansiedade com que se aguarda o laudo contraditório da APSS.

Força nisso, senhores! Como é que dizem os brasileiros? Ah! Sim! "Pé na tábua e fé em Deus!"

Mas, como bem dizem também os nossos irmãos da parte sudoeste do Atlântico, desta vez “danou-se mesmo, hein, cara?!”

Tuesday, April 05, 2005

21. Teresa, a nova civil governante de Setúbal

Foi hoje empossada a nova governadora civil de Setúbal, arquitecta de profissão, socialista de opção.

Com larga experiência dos “dossiers” da Câmara Municipal cá do burgo, Teresa Almeida ficou célebre, aqui há tempos, por uma excepcional e arriscadíssima manobra de ultrapassagem pela esquerda, quando, em debate radiofónico em estação local, afirmou, com toda a convicção e sem sequer ter esboçado um sorriso de constrangimento, que, sendo o PS um partido de esquerda, apenas se preocupava com os mais desfavorecidos, razão por que a construção de uma marina em Setúbal não era coisa que a preocupasse, não a tendo até feito incluir no projecto Polis, de que tratara.

A partir desta elegante e politicamente muito correcta tirada se ficou a saber que:

....1. O PS e os seus políticos continuam na mesma e, particularmente em Setúbal, na mesma continuam: demagogos até à medula, capazes dos mais arrojados unstable balances para chegarem onde julguem que há votos a conquistar;
....2. Na opinião de Teresa Almeida – e na do PS local, pelos vistos – uma marina não constitui excelente fonte de receita e extraordinário chamariz, que certamente muito contribuiria para o desenvolvimento do tão maltratado turismo da região, com benefício para todos, os mais desfavorecidos incluídos;
....3. Pela mão de Teresa Almeida, o PS chegou mesmo a ultrapassar o PC pela esquerda baixa, uma vez que é o próprio actual edil setubalense, o aggiornato comunista Carlos Sousa, que realisticamente entende ser a marina um requisito essencial para o desenvolvimento de Setúbal;
....4. Por mentalidades, como a de Teresa Almeida, terem estado à frente dos destinos do concelho, entre 1986 e 2001, é que Setúbal conseguiu a discutível proeza de, 19 anos após a entrada de Portugal na então CEE, ser a capital de distrito que menos se desenvolveu, arriscando-se mesmo a, dentro em pouco ser ultrapassada – também, imagine-se! – pela Aldeia Galega e até mesmo, quiçá, por Alcochete, não obstante dispor de condições desenvolvimentistas naturais absolutamente ímpares no País.

Felizmente que, no cargo que agora vai ocupar a ex-autarca terá muito menos oportunidades de menorizar o concelho e o distrito. É que, representando o governo central em algumas cerimónias menores, assinando uns quantos passaportes, “decretando” até que horas cafés, leitarias, bufetes, bares, tascas e outros pontos de encontro da vida em sociedade podem estar abertos, e minudências que tais, não parece que dali possa vir grande atraso ao mundo, que é como quem diz aos setubalenses.

Por isso, não constitui esforço particularmente penoso augurar-se-lhe bom sucesso nas “funções que me são
confiadas”.

Monday, April 04, 2005

20. João XXI, o Papa português - nota breve

Pedro Julião, mais conhecido por Pedro Hispano ou Pedro Hispano Portucalense, nasceu em Lisboa, em 1205 ou 1210, e morreu em Viterbo (Itália), em 1277. Médico e filósofo, chegou a papa, tendo adoptado o nome João XXI.

Estudou em França e Itália. Leccionou filosofia em Paris e medicina em Siena. Esteve também na Corte de Frederico II. Foi arquiatra (médico assistente) de Gregório X. Após a morte deste último, em 1276, e dos seus sucessores, no mesmo ano, foi, em Setembro, ainda de 1276, nomeado papa.

Antes de atingir o Papado, foi Prior de Mafra, cónego da Sé de Lisboa, prior da Colegiada de Guimarães e, finalmente, eleito arcebispo de Braga, não tendo sido confirmado por, sendo já médico assistente do Papa, este o ter nomeado cardeal bispo de Tusculum. Foi um dos participantes do II Concílio de Lyon. Dante cita-o na Divina Comédia.

Em 1276, faleceu o Papa Gregório X, tendo-lhe sucedido Inocêncio V e, por força do passamento deste, Adriano V, que igualmente faleceu no mesmo ano. Na sequência destes óbitos chegou Pedro Hispano, João XXI, ao pontificado. Talvez essa a razão por que alguns dos seus detractores referem, curiosamente nunca de forma muito afirmativa, que se tratava de clérigo apagado e de fraca preparação, que só levou a bom termo o seu múnus pontifício por se ter rodeado de colaboradores de elevado gabarito.

Ora, tal alegação parece cair pela base logo que se tenha presente que João XXI foi autor do Tractatus, mais tarde chamado Sumulae logicales (Súmulas da Lógica), em que resume o pensamento lógico de Aristóteles. A obra foi mesmo adoptada como compêndio universitário em toda a Europa até meados do século XVI, por cerca de três séculos, portanto.

Dedicou-se igualmente a escrever sobre medicina, tendo comentado Galeno e Hipócrates e publicado Thesaurus pauperum, enciclopédia de estudos médicos, editada mais de 80 vezes em diversas línguas europeias.

Muito conhecido pelos vastos conhecimentos em ciências várias, João XXI foi papa por apenas oito meses e uma semana. Tendo recebido ferimentos graves, quando da derrocada de uma parte do Palácio dos Papas, em Viterbo, que se encontrava em obras de restauração e alargamento, que ele próprio decretara, faleceu em 20 de Maio de 1277.


Texto elaborado a partir de recolha de fontes diversas.

Saturday, April 02, 2005

19. Deixe-se de negaças, António Borges!

Para ser inteiramente claro, ab initio, tenho que começar por dizer que subscrevo integralmente a posição assumida por Luís Delgado, quando, na coluna de opinião de anteontem, Linhas Direitas, no DN, sob o título “A moção de Borges”, afirma que este tem que avançar para tentar a liderança, sem o que não faz sentido apresentar uma moção de estratégia global.

Na verdade, assim é.

Na política não pode estar-se com um pé dentro e outro fora, numa política de seriedade não há lugar para jogos de negaças, que para esse peditório já muitos deram e quem nele uma vez participou algo terá aprendido com a experiência e, portanto, já não se mostrará muito aberto a tais jogos por detrás da cortina.

Político consequente, que aspira a ser tomado a sério, não ameaça que vai, mas acaba por não ir, não dá um passo em frente e logo outro atrás. Isso não será mais do que a revelação de espírito errático e timorato, que verdadeiramente não decide se quer ou não quer, inconsequente, portanto muito pouco coerente com a atitude responsável e de afirmação clara que é exigível a um aspirante a líder social-democrata que, sendo-o, estará sempre na calha para chegar ao topo da hierarquia do governo de Portugal.

Negaças como aquela a que estamos a assistir deixam, pois, muito a desejar, e dão, de quem assim evoluciona, uma imagem de que os social-democratas se cansaram já – esperemos que de uma vez por todas – e que, por conseguinte, in limine renegam.

Assim, António Borges tem que decidir, já, se vai disputar a liderança do partido ou não e, em caso de a resposta a esta questão ser negativa, só lhe resta um caminho: sair de cena o mais rapidamente que lhe for possível, pela esquerda baixa, deixando que outros, mais afoitos, mais frontais e, portanto, mais merecedores de confiança, dirimam entre si a honra de presidirem aos destinos do PSD. Mesmo que não tenham curriculum similar.

É que – e António Borges tem que interiorizar isso muito rapidamente, entre hoje e amanhã, diria mesmo – o PSD não merece continuar a ser cozido em lume brando por políticos de bastidores, sem coragem para se apresentarem, de cara ao sol, perante todos, como pretendentes à liderança. De corpo inteiro. Jogos de cintura e malabarismos que tais podem ser muito bons para que a Comunicação Social venda papel, mas não acrescentam nada ao partido que se diz apoiar. Muito pelo contrário, apenas servem para mais o afundar.

É preciso, pois, que António Borges se esforce por mostrar-se diferente, que seja ele mesmo – seja lá quem for – para o bem ou para o mal, e que deixe de esconder-se por detrás de cortinados mais ou menos empoeirados, pouco reveladores do asseio necessário. E que, tomada a decisão de se mostrar diferente, frontal, não tenha rebuço em levar quem o acompanha ou assessora ou incentiva a tomar idêntica atitude.

O PSD necessita, como de pão para a boca, de clareza, de frontalidade por parte dos seus dirigentes. De dirigentes que saibam para onde querem ir, com quem, de que forma e prosseguindo que objectivo. E a primeira atitude que há que tomar consiste na assumpção plena de uma candidatura integral. Porque essa coisa esquisita de se apresentar uma moção de estratégia global sem se chegar à conclusão curial e inevitável de assumir candidatura à presidência do partido, a verificar-se, constitui autêntica aberração, desvendando, por outro lado, uma linha de pensamento e actuação mais do que errática, verdadeiramente tortuosa, só não comparável às florentinices dos Bórgias por lhe faltarem, ainda – e, assim sendo, queira Deus que para sempre - a possidência e o mando.

Em boa verdade, qual a real finalidade da apresentação de uma moção de estratégia global, sem a consequente candidatura às funções que possibilitem levá-la a termo? Certamente que não estará na mente do(s) subscritor(es) fazê-la aprovar em congresso para que outros a cumpram. Seria o cúmulo da desfaçatez. E para desfaçatezes, já basta assim, como diria o baladista. Não, isso certamente que não será. Então, por que apresentá-la? Como mero exercício de retórica? Não posso crer nisso também. É demasiado pouco para quem já tanto deu a entender prometer, se bem que sem querer comprometer-se.

É isto que não pode manter-se, porque não conduz a objectivo real e mobilizador, porque apenas serve para cozer o PSD no lume brando que o conduzirá à apagada e vil tristeza, onde tentará sobreviver até que apareça alguém suficientemente capaz de o fazer regressar à condição para que nasceu e que levou a que tantos, ao longo de três décadas, muito de si dessem para que se concretizasse.

Então, é assim: deixe-se de negaças, António Borges. Aja! Com decisão e sem tergiversações, aja em consequência. Ou, então, saia do palco. Já! Se, agindo, lograr os seus objectivos e se eles forem os de levar o PSD a reerguer-se para melhor servir o País, muito bem, terá vencido e receberá o aplauso e apoio dos seus correlegionários agora e dos seus concidadãos mais tarde; se não conseguir, pelo menos restar-lhe-á a consciência de que, honesta e frontalmente, tentou, dando o seu melhor. Ninguém lhe exigirá mais seja o que for.

Mas, por amor de Deus, não faça o que Cavaco fez na Figueira da Foz. Esse é o caminho menos directo, mais curvilíneo, menos corajoso, mais antipático. E que deu frutos uma vez, por estar reunido um conjunto de circunstâncias aleatárias que agora não existe. E que dificilmente voltará a existir. Quanto a mim, ainda bem, malgré tout!

Ruben Valle Santos
2005Abril02 - 12,15h

Friday, April 01, 2005

18. Do excesso de garantismo de defesa em juízo

"Um quinto do tempo dos tribunais é um tempo em que a maioria dos processos estão parados"
Alberto Costa, Jornal de Notícias, 31-03-2005

* * *

O senhor ministro sabe bem, como o sabiam todos os antecessores de há, pelo menos, duas décadas para cá, que o problema da Justiça em Portugal e dos seus atrasos e falta de capacidade de resposta, não reside no problema das férias judiciais, nem nos magistrados, judiciais ou do MºPº, nem nos funcionários. Nem nos advogados, enquanto profissionais do foro, a usarem, em proveito dos clientes, os meios que as leis permitem. Daí que a sua frase, acima transcrita, seja perfeitamente inócua e vazia de sentido, que nem sequer consegue induzir em erro mais do que aqueles que acerca dos tribunais e do seu funcionamento jamais tiveram notícia. Isto, se o senhor ministro realmente souber do que está a falar, ainda que fale a despropósito. Se, porém, não souber e estiver convencido do que afirma, então a situação é mais grave. Porque, então, não nos restará qualquer dúvida de que tudo ficará na mesma. Sem remédio.

Dêem a quem é profissional do foro e sem interesses externos aos tribunais, quantas vezes ilegítimos, a capacidade de influenciar o processo legislativo e, aí, sim, acredito que algo de positivo surja.

As gravíssimas dificuldades por que passam os tribunais e os cidadãos que a eles têm que recorrer resultam das absurdas leis processuais que temos.

Provocam, essas disparatadas leis, um excesso de garantismo de defesa absolutamente idiota e só possível em sociedade que ainda não ultrapassou traumas do Estado autoritário que vivemos até há trînta anos atrás, a que se seguiu, em contraponto, um outro estádio não menos traumatizante.

Esse excesso de garantismo - a todos os níveis e em todos os tipos de processos - conduzem a que se possa recorrer de todo e qualquer despacho ou acto judicial, em qualquer altura, com efeitos suspensivos, circunstância que obriga a que os processos párem a sua tramitação normal por espaços de tempo absolutamente incompreensíveis e prolongados. E seria mesmo levado a afirmar - sem receio de desmentido - que, afora um ou outro caso, a esmagadora maioria dos recursos interpostos o são por motivos de mera dilacção de prazos - poderíamos mesmo dizer "chicana judicial" -, quando nada impedia, antes tudo aconselhava que subissem apenas com o recurso da decisão final.

Mas não apenas no que à capacidade de recorrer por tudo e por nada se refere.

As leis processuais estão prenhes de verdadeiras incongruências que apenas servem para arrastar a tramitação dos casos levados a juízo. Poderia aqui elencar inúmeros exemplos. Todas as pessoas que, de uma forma ou de outra, alguma vez estiveram ligadas aos tribunais o sabem, Não é, pois, segredo para ninguém. Menos ainda o deverá ser, é evidente, para os senhores ministros. Este e os que o antecederam. E outros responsáveis. Que os há.

Tudo o que se fizer na "tentativa" de melhorar a situação e não tenha presente esta realidade de trinta anos - e vontade de a combater -, não passará de mera cosmética, para enganar tolos e deixar tudo na mesma.

Porquê? Por razão simples.

Para que se compreenda melhor toda a envolvência, é preciso que se pense que, qualquer processo a correr termos em tribunal pressupõe um conflito de interesses. E, nesse conflito de interesses, inclui-se, a partir do momento em que se recorre ao tribunal, o apressar do andamento do processo em contraposição com o do seu protelamento. Facilmente se perceberá, deste modo, que, se a lei, em lugar de pôr tudo no são, oferecer a quem defende excesso de garantias de defesa (que é disso que se trata), torna-se inevitável o arrastamento do calvário judicial. E é preciso não esquecer que, quem hoje pretende que o processo ande célere, amanhã estará na barra contrária, convindo-lhe, então, que o processo se arraste. Pelo que a coisa toca a todos. E lá estamos no ciclo vicioso que tudo vicia de há décadas a esta parte, sem que apareça quem, liberto de pressões e teias, lhe ponha termo de uma vez por todas, com o objectivo único de servir o todo da sociedade e não apenas parcelas mais ou menos corporativistas e prenhes de poder dessa mesma sociedade.

A duração do tempo das férias judiciais não passa de questão de pura demagogia. Em saldo, para mais. E a ver vamos, algum tempo depois de terem sido reduzidas, se o vierem a ser... Vamos ver que vai ficar pior, porque deixará de existir o tempo que agora é aproveitado para pôr em ordem coisas que a azáfama, balbúrdia mesmo, do dia-a-adia não permite.

Espero ter-me feito entender.