33. Tradicionalmente… a falta de “cojones”
Entrevistado na TVI, dias atrás, logo a seguir ao Jornal das 20, por Constança Cunha e Sá, o candidato à presidência da república, Manuel Alegre de seu nome, poeta de vocação, político por acidente, disse algumas coisas interessantes, deixou por dizer outras que talvez fossem interessantes e exercitou a sua costela de lusa intriga e circunlóquio infecundo, sem frontalidade.
Não cuidemos aqui do que disse; tão pouco do que não disse. Cuidemos, isso sim, do que, não dizendo, disse, ou dizendo, não disse. E que foi que o homem – que aspira a ser presidente desta república de gente que teme a frontalidade mais do que a Belzebu, ele mesmo, escrito e escarrado – disse que não disse, mas não dizendo disse?
Que os antecedentes da candidatura de Mário Soares não se tinham pautado pela lisura que deve presidir a estes actos de suma importância para a vida nacional.
É certo que o alegre poeta não o disse aberta, frontal e chapadamente, como lhe competia. No entanto, não dizendo e dizendo mesmo que não queria dizer, lá foi dizendo, embora desdizendo que o que dizia não estava a dizer.
No fim, ficámos todos abstrusos, porque este diz que não diz e não diz que diz se presta a tudo e mais alguma coisa, tendo, porém, o condão de não comprometer o dizente maldizente que por não maldizente, diz que não diz… mas insinua.
E o que é que o insigne político da nossa praça, não dizendo insinuou – apenas, porque a pobre da Constança até já toda se contorcia, no esforço de lhe arrancar da boca para fora aquilo que o homem estava louco por revelar ao comum dos mortais que assistia ao desvario, mas que não teve cojones bastantes para afirmar preto no branco?
Que Mário Soares não observara regras de conduta correcta e lisa, em todo o processo da sua candidatura à presidência da república. Que não será, portanto, candidatura tão linear como isso.
Qualquer pessoa normal, depois de ouvir o que se ouviu do alegre Manuel, depois de repetidamente esfregar os olhos, não querendo acreditar no que ouvia – mas afinal, não estava, pelo emissor, autorizado a ouvir, já que o não dizia, embora parecendo que dizia – apenas pôde tirar uma conclusão:
Nobre Soares portara-se de forma pouco conveniente com os bons costumes políticos – quiçá mesmo até sociais – em todo aquele processo.
Garanto-vos que até o filho do meu vizinho – que entrou para a pré-primária em Outubro passado, me apareceu cá em casa, muito excitado, dizendo:
- O Manel Alegre tá a dizer na televisão qu’o Marocas se portou mal com ele – e não só com ele… – só pra ser candidato a presidente da república. Ó qu’isto chegou, c’um escanfandro, pá!
Impressionado com a capacidade de percepção e análise de que o pequeno dava mostras, fiquei sem fala!... E, assim, nem fui capaz de lhe responder algo, ainda que desajeitadamente. Podia ter argumentado que não era bem assim… – ao jeito dos políticos que distorcem tudo o que se diz… e até o que não se diz… – mas qual quê?! Fiquei mudo e estarrecido, incapaz de uma reacção. O raio do gaiúlo acertara na mouche.
No entanto, essa minha condição de surpreendido passou já e, agora, não respondendo ao miúdo – já que ele nem precisa da resposta, uma vez que a intuíu também – sempre quero aproveitar este ensejo para dizer umas coisitas.
Elas aí vão:
Esta característica tão vincada dos políticos portugueses é, ela também, um dos factores que fazem com que dificilmente os possamos já encarar, quanto mais aturar. Não há pachorra, pessoal!
Na verdade, não há, sobre a crosta terrestre, políticos como os portugueses, com tanta falta de cojones.
É a realidade! Falta de cojones! Falta daquilo que, antigamente, punha barba na cara dos homens, farta cabeleira púbica e voz grossa quanto baste, com a maçã de Adão a subir e a descer, em grande agitação, no decurso de disputa mais acesa, de homens de cojones pretos, como antigamente se dizia. O tempora, o mores!
Então, compreende-se lá que o senhor Manuel Alegre, poeta de versos ribombantes, não descubra em si testosterona em quantidade suficiente para, frontalmente, de cabeça erguida, na cara do outro, publicamente como manda a frontalidade da democracia, dizer alto e bom som, para que todos fiquemos a saber, que atitudes não condizentes com a correcção que deve presidir a actos desta natureza atribui ao seu ex-camarada de coração, Mário Soares?
E não me venham dizer que, se algo – ainda que grave – aconteceu, é coisa lá entre eles e ninguém tem nada que ver com isso. Porque temos. Temos mesmo muito a ver com isso.
Se os factos não declarados, mas insinuados, são graves, da gravidade que o poeta Manuel lhes atribuiu, não atribuindo, porém, nós temos todo o direito de saber quais são. Porque podem ser factos relacionados com o carácter de um candidato à presidência da república e isso, como facilmente se compreende, interessa muito ao eleitor, a qualquer eleitor, ao eleitorado em geral, todo ele. Ao País, carago!
Quem é que não quer saber se o candidato em quem se apresta para votar – ou não – é pessoa de carácter íntegro como mister é que seja, para decentemente desempenhar o cargo a que se candidata, no caso de ser eleito?
Em democracia, estas coisas têm suma importância. Apenas em ditadura ninguém lhes liga nenhuma. Em democracia que se preze, o carácter – e os interesses, económicos ou outros, já agora não é… – de um político têm que ser devidamente escrutinados. Para que o político, no caso de ser eleito, se possa apresentar ao exercício do alto cargo, em condições imaculadas... tanto quanto possível, claro está.
Ora, Manuel, o alegre poeta, desta vez mostrou-se bem pouco alegre e aberto, como convém a político democrático. Se ele sabe, como insinuou, de algo que, em sua opinião, não esta correcto no processo, tem a estrita obrigação, o inalienável dever de o dar a conhecer publicamente. Sob pena de se tornar conivente com atitudes menos próprias e adequadas, que não quadram com um possível futuro presidente da república.
Manuel Alegre tem que assumir-se como político frontal, porque é de frontalidade política e democrática que todos bem precisados andamos, como de pão para a boca. E, além disso, se concorre a presidente da república, mais uma razão para se mostrar capaz de frontalidade democrática. Quem é que pode votar num candidato incapaz de ser frontal e que se fica por meras insinuações, “bocas” de fundo de cena, de quadrilha, sem coragem para mais?
As “bocas” à “boca pequena” – e outras coisas que tais – apenas nos conduziram à situação em que estamos, em que só os recém-nascidos e que ainda nem os olhos abriram acreditam nos políticos que nos conduzem os destinos.
Manuel Alegre, tonitruante como ele, mais do que ninguém, sabe ser, tem que meter a boca no trombone e despir quem deve ser despido em praça pública. Democraticamente despir, quem veste roupa que não lhe pertence.
Democraticamente, pois então!
Estamos saturados de políticos timoratos e coniventes, que, de sussurro em sussurro, de insinuação em insinuação, sem coragem para mais, vão guardando os esqueletos de família de cada qual, dentro de armários fundos como a “Boca do Inferno” da política caseira e escuros como o breu mais breu que jamais alguém concebeu.
Cojones, Manuel, cojones! Ao menos uma vez na vida!
A democracia é, acima de tudo, isso. Transparência que resulta da frontalidade e da assumpção, pois então!
Assume-te, homem!
…
Não cuidemos aqui do que disse; tão pouco do que não disse. Cuidemos, isso sim, do que, não dizendo, disse, ou dizendo, não disse. E que foi que o homem – que aspira a ser presidente desta república de gente que teme a frontalidade mais do que a Belzebu, ele mesmo, escrito e escarrado – disse que não disse, mas não dizendo disse?
Que os antecedentes da candidatura de Mário Soares não se tinham pautado pela lisura que deve presidir a estes actos de suma importância para a vida nacional.
É certo que o alegre poeta não o disse aberta, frontal e chapadamente, como lhe competia. No entanto, não dizendo e dizendo mesmo que não queria dizer, lá foi dizendo, embora desdizendo que o que dizia não estava a dizer.
No fim, ficámos todos abstrusos, porque este diz que não diz e não diz que diz se presta a tudo e mais alguma coisa, tendo, porém, o condão de não comprometer o dizente maldizente que por não maldizente, diz que não diz… mas insinua.
E o que é que o insigne político da nossa praça, não dizendo insinuou – apenas, porque a pobre da Constança até já toda se contorcia, no esforço de lhe arrancar da boca para fora aquilo que o homem estava louco por revelar ao comum dos mortais que assistia ao desvario, mas que não teve cojones bastantes para afirmar preto no branco?
Que Mário Soares não observara regras de conduta correcta e lisa, em todo o processo da sua candidatura à presidência da república. Que não será, portanto, candidatura tão linear como isso.
Qualquer pessoa normal, depois de ouvir o que se ouviu do alegre Manuel, depois de repetidamente esfregar os olhos, não querendo acreditar no que ouvia – mas afinal, não estava, pelo emissor, autorizado a ouvir, já que o não dizia, embora parecendo que dizia – apenas pôde tirar uma conclusão:
Nobre Soares portara-se de forma pouco conveniente com os bons costumes políticos – quiçá mesmo até sociais – em todo aquele processo.
Garanto-vos que até o filho do meu vizinho – que entrou para a pré-primária em Outubro passado, me apareceu cá em casa, muito excitado, dizendo:
- O Manel Alegre tá a dizer na televisão qu’o Marocas se portou mal com ele – e não só com ele… – só pra ser candidato a presidente da república. Ó qu’isto chegou, c’um escanfandro, pá!
Impressionado com a capacidade de percepção e análise de que o pequeno dava mostras, fiquei sem fala!... E, assim, nem fui capaz de lhe responder algo, ainda que desajeitadamente. Podia ter argumentado que não era bem assim… – ao jeito dos políticos que distorcem tudo o que se diz… e até o que não se diz… – mas qual quê?! Fiquei mudo e estarrecido, incapaz de uma reacção. O raio do gaiúlo acertara na mouche.
No entanto, essa minha condição de surpreendido passou já e, agora, não respondendo ao miúdo – já que ele nem precisa da resposta, uma vez que a intuíu também – sempre quero aproveitar este ensejo para dizer umas coisitas.
Elas aí vão:
Esta característica tão vincada dos políticos portugueses é, ela também, um dos factores que fazem com que dificilmente os possamos já encarar, quanto mais aturar. Não há pachorra, pessoal!
Na verdade, não há, sobre a crosta terrestre, políticos como os portugueses, com tanta falta de cojones.
É a realidade! Falta de cojones! Falta daquilo que, antigamente, punha barba na cara dos homens, farta cabeleira púbica e voz grossa quanto baste, com a maçã de Adão a subir e a descer, em grande agitação, no decurso de disputa mais acesa, de homens de cojones pretos, como antigamente se dizia. O tempora, o mores!
Então, compreende-se lá que o senhor Manuel Alegre, poeta de versos ribombantes, não descubra em si testosterona em quantidade suficiente para, frontalmente, de cabeça erguida, na cara do outro, publicamente como manda a frontalidade da democracia, dizer alto e bom som, para que todos fiquemos a saber, que atitudes não condizentes com a correcção que deve presidir a actos desta natureza atribui ao seu ex-camarada de coração, Mário Soares?
E não me venham dizer que, se algo – ainda que grave – aconteceu, é coisa lá entre eles e ninguém tem nada que ver com isso. Porque temos. Temos mesmo muito a ver com isso.
Se os factos não declarados, mas insinuados, são graves, da gravidade que o poeta Manuel lhes atribuiu, não atribuindo, porém, nós temos todo o direito de saber quais são. Porque podem ser factos relacionados com o carácter de um candidato à presidência da república e isso, como facilmente se compreende, interessa muito ao eleitor, a qualquer eleitor, ao eleitorado em geral, todo ele. Ao País, carago!
Quem é que não quer saber se o candidato em quem se apresta para votar – ou não – é pessoa de carácter íntegro como mister é que seja, para decentemente desempenhar o cargo a que se candidata, no caso de ser eleito?
Em democracia, estas coisas têm suma importância. Apenas em ditadura ninguém lhes liga nenhuma. Em democracia que se preze, o carácter – e os interesses, económicos ou outros, já agora não é… – de um político têm que ser devidamente escrutinados. Para que o político, no caso de ser eleito, se possa apresentar ao exercício do alto cargo, em condições imaculadas... tanto quanto possível, claro está.
Ora, Manuel, o alegre poeta, desta vez mostrou-se bem pouco alegre e aberto, como convém a político democrático. Se ele sabe, como insinuou, de algo que, em sua opinião, não esta correcto no processo, tem a estrita obrigação, o inalienável dever de o dar a conhecer publicamente. Sob pena de se tornar conivente com atitudes menos próprias e adequadas, que não quadram com um possível futuro presidente da república.
Manuel Alegre tem que assumir-se como político frontal, porque é de frontalidade política e democrática que todos bem precisados andamos, como de pão para a boca. E, além disso, se concorre a presidente da república, mais uma razão para se mostrar capaz de frontalidade democrática. Quem é que pode votar num candidato incapaz de ser frontal e que se fica por meras insinuações, “bocas” de fundo de cena, de quadrilha, sem coragem para mais?
As “bocas” à “boca pequena” – e outras coisas que tais – apenas nos conduziram à situação em que estamos, em que só os recém-nascidos e que ainda nem os olhos abriram acreditam nos políticos que nos conduzem os destinos.
Manuel Alegre, tonitruante como ele, mais do que ninguém, sabe ser, tem que meter a boca no trombone e despir quem deve ser despido em praça pública. Democraticamente despir, quem veste roupa que não lhe pertence.
Democraticamente, pois então!
Estamos saturados de políticos timoratos e coniventes, que, de sussurro em sussurro, de insinuação em insinuação, sem coragem para mais, vão guardando os esqueletos de família de cada qual, dentro de armários fundos como a “Boca do Inferno” da política caseira e escuros como o breu mais breu que jamais alguém concebeu.
Cojones, Manuel, cojones! Ao menos uma vez na vida!
A democracia é, acima de tudo, isso. Transparência que resulta da frontalidade e da assumpção, pois então!
Assume-te, homem!
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