34. O respeito devido à dignidade pessoal...
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Em desespero de causa, Mário Soares tem vindo diariamente a queixar-se das “patifarias” com que a Comunicação Social, também diariamente, o presenteia.
Não gosto nem um pouco de Soares. Nunca gostei, diga-se em abono da verdade e vou mesmo mais longe: ao contrário de uma certa ideia por aí sempre muito instilada no espírito de cidadãos menos atentos e vocacionados para análises mais profundas, para além das ilusórias aparências, entendi sempre que o homem não tem aquele espírito democrático e bonacheirão com que sempre foi mostrado. Muito pelo contrário, por detrás do manto diáfano da fantasia, esteve sempre camuflada a nudez crua da verdade. E a verdade é, em minha opinião, que Soares foi sempre – e continua a ser – um chefe autoritário, deus todo-poderoso, a quem ninguém se poderia opor, sem sofrer as consequências, por mais razões que lhe assistissem. Uma breve retrospectiva do que foram estes últimos 30 anos provará à evidência e à saciedade o que afirmo.
Sou, contudo, igualmente de opinião de que o homem tem razão para se queixar amargamente, desta vez.
Efectivamente, a Comunicação Social, a única instância do país que dispõe de poder real – poder que faz e desfaz governos e outros poderes legítimos não deixados à solta, poder que faz e desfaz reputações sempre a coberto da maior das impunidades, poder que, como se vê, não é enformado da mais linear e insignificante das características de qualquer poder democrático, porque é o único não escrutinado e porque jamais alguém foi capaz de legislar, no sentido de o conter dentro das baias democráticas – tem vindo a entreter-se a escarafunchar-lhe os piores momentos da triste campanha que vem desenvolvendo.
A CS tem, pois, vindo a alcandorá-lo a estrela-diva do bufo espectáculo ad-presidencial. Sempre, porém, pelas piores razões. Sempre. Com razão ou sem ela. Inexorável e execrável.
E as coisas têm-se deteriorado de tal forma que até o Expresso, jornal geralmente considerado de referência e respeitável – esta já não é, de há muito, a minha opinião – se presta a entrar no jogo das indecências.
Na verdade, a capa da sua última edição – de 7 de Janeiro – exibe uma fotografia de Soares, que o mais elementar dos respeitos devidos à dignidade pessoal de cada homem deveria ter imposto aos responsáveis pela paginação, a começar pelo director do jornal, que não exibissem. Mas não apenas pela dignidade do retratado; também – e talvez em maior medida – pela própria dignidade dos autores da façanha, que me parece terem ficado muito mal retratados na foto.
O Expresso não tem o direito de cometer tamanha sacripantice. O Expresso – os seus responsáveis – têm o estrito dever de se coibir de alinhar em campanhas de política suja e – peço desculpa, mas é o termo que mais se adequa ao caso – ranhosa.
É certo que Soares estava a pedi-las. Tal facto, porém, não “angeliza” os expressos brincalhões da treta.
Entendo que, por uma questão de dignidade – própria, evidentemente – o Expresso deve apressar-se a apresentar desculpas à sua vítima, no caso indefesa. Será que haverá no Expresso, ao nível decisório, quem tenha um pouco de vergonha na cara e… dignidade, já agora?
* * *
Quanto a Mário Soares, estou do lado dele como pessoa – por entender que o que lhe foi feito não se faz a ninguém. Por muito que o mereça. E Soares, o político, merece-o, sem dúvida.
No entanto, talvez que agora, em face de algumas patifarias que lhe estão a ser feitas por poderes não escrutinados e claramente antidemocráticos, consiga aperceber-se da real dimensão das ignomínias que o mesmo poder praticou relativamente a Pedro Santana Lopes, mas, neste caso, elevado à 15ª potência!
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