Tuesday, May 24, 2005

27. Já agora, ponhamos tudo no são, ok?

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Muito se tem falado no deficit orçamental nestes últimos dias!
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Infelizmente, quase sempre com tal dose de demagogia que ultrapassa tudo aquilo a que em Portugal já estamos habituados (e atente-se na circunstância de estarmos habituados a doses bem maciças…).

Sejam políticos, sejam jornalistas, sejam meros gatos pardos, que os há às dúzias, por aí, todos falam do deficit, por forma a induzir em erro quem ouve e quem lê, que não esteja decentemente informado do que se passa. Abordam o tema do deficit de 6,83%, como se ele fosse já uma realidade. Tanto quanto me lembro, apenas o editor de economia da SIC foi suficientemente sério para esclarecer a situação.

Na verdade, o deficit de que tanto se fala mais não é do que uma previsão e, como todas as previsões, falível. E manipulável.

Além disso, é preciso não esquecer que o orçamento foi elaborado pelo anterior governo, em tempo record, por pressão do presidente da república, de seu nome Jorge Sampaio, pelo que o governo anterior terá culpas, mas não aquelas que se lhe apontam. Adiante falaremos mais disto.

Pôr tudo no são, é apontar factos, erros e responsabilidades, talvez dolos e má fé, entre outras coisas. Dito de forma diversa, é dar nome aos bois, como se diz em português escorreito.

Vejamos, então, que culpas cabem a cada um:

No capítulo da incompetência (quiçá mesmo má fé) –
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Sem dúvida, Vítor Constâncio. Porquê? Simples. Aqui há uns 4 ou 5 meses, por ocasião da feitura do orçamento e até bem depois disso, entendia que tudo estava controlado, que o orçamento era correcto, não havia outro caminho e, consequentemente, estava em consonância com o governo de então, o tal de Santana Lopes.
Hoje, passado este tempo, vem com ar trágico-cómico, anunciar que isto está de rastos. Daqui se retira uma, de duas: ou é incompetente mesmo, ou actuou de má fé ontem ou hoje. Em qualquer dos casos, devia arcar com as responsabilidades que tem, que são graves.

No capítulo de responsabilidades gerais –

O governo de Guterres, que foi quem tudo isto começou, com demagogia jamais vista até então e as facilidades que se sabem. Foi um governo que, em 6 anos, delapidou tudo o que levara cerca de 15 a construir;

O governo de Durão Barroso, que, tendo começado uma tarefa de saneamento orçamental, desistiu a meio e – não respeitando o compromisso que tinha assumido - “deu” o encargo a outro que não contava com tal “benesse” e se viu, subitamente, com o menino nos braços, um menino que não gerara e a que nem sequer contava ter que dar paternidade;

O presidente da república, Jorge Sampaio, por motivos vários, todos bastante graves (em minha opinião, é mesmo que tem responsabilidades maiores e mais graves):

- Nomeou Santana Lopes primeiro-ministro, tendo já preparado todo o cenário para, em altura conveniente para o PS, o demitir, sem fundamentos válidos, como bastamente se viu. A isto se chama hipocrisia política, mas também irresponsabilidade ilimitada, por, ocupando o cargo que ocupa, imolar os interesses de todo um povo, no altar do sacrifício da sua capelinha própria. Sampaio, em três ou quatro meses, destruíu tudo o que de bom terá vindo a construir na vida, em favor da sua imagem de cidadão inteiro, do País, primeiro do que de grupos;

- Por ter demitido o governo de Santana Lopes, como premeditadamente tinha em mente, ainda este mal tivera tempo de inspirar fundo para se lançar ao trabalho, ou seja, cerca de 4 meses depois de o ter nomeado – trata-se de responsabilidade gravíssima no estado a que as coisas chegaram, em termos de deficit, já que o governo nada pudera ainda fazer e foi destituído precisamente no momento em que começara a trabalhar, tentando fazer algo de concreto para proceder a reformas de que o País precisa. Por força desse acto gravoso, deixou que o país ficasse à deriva durante mais de 4 meses, ou seja, desde o aviso de dissolução, anunciada com muita antecedência, como se sabe (a hipocrisia não tem limites…) até à tomada de posse do governo que lhe ia mais de feição;

- Pressionou, com a autoridade que lhe dá o cargo que ocupa (ocupar, note-se, é bem diverso de exercer), o governo de Santana Lopes, para que elaborasse o orçamento para 2005, quando tal tarefa deveria caber a outros e jamais a quem estava de saída, com morte anunciada;

O governo de Santana Lopes, porque submissamente se curvou à vontade do presidente (a quem muito se baixa é normal ver-se-lhe o traseiro...), tendo aceitado elaborar um orçamento que sabia que podia não ser ele a gerir, correndo o risco em que agora se vê de arcar com responsabilidades que objectivamente não pode ter;

Sócrates e o PS (repare-se que propositadamente não digo “o Governo de Sócrates”), porque, tendo prometido bacalhau a pataco e mais o “euromilhões” para todos os portugueses, quando sabia que as promessas não podiam ser cumpridas, agora, para salvar a face, manda empolar a situação, para se “limpar”, por ter que desrespeitar os compromissos que assumiu perante os portugueses, com evidente dolo.

Daqui se retira que o menos culpado é precisamente aquele a quem as culpas maiores estão agora a ser atribuídas. O mesmo de sempre, aliás: Santana Lopes, o bombo que está a servir para a festa de todos os verdadeiros responsáveis, só que não para a dele próprio, que será, como é bem sabido, quem maior legitimidade tem para acusar.

Uma última nota, antes de passar a outro aspecto desta saga de vergonha:

Resta ainda saber se a previsão tão pressurosamente agora apresentada por Vítor Constâncio, não representa - apenas e tão só - um enormíssimo embuste, frete feito aos seus amigos e camaradas do governo, dando-lhes, assim, a abertura de que tanto precisam para agravar impostos e acabar com as “scuts”, em desavergonhado desrespeito pelo que dolosamente andaram a prometer, ludibriando o eleitorado, pois sabiam que não era legítimo que o fizessem.
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É que, assim sendo, tendo exagerado na previsão – que, repito, tem vindo a ser apresentada já como realidade e não mera previsão, como a decência mandava que se fizesse – uma vez chegados ao final do exercício de 2005, tudo o que for abaixo desta “previsão” será contabilizado a favor de Sócrates e camaradas, mesmo que nada tenham feito de útil, entretanto, como é previsível e se vai ver, chegado o tempo próprio.

Por outro lado, temos tido oportunidade de assistir à laboriosa faina da central de intoxicação do PS (canhestra, desajeitada de todo, paisana mesmo, mas que em Portugal resulta, pela tão lusa falta de sentido crítico de que tantas vezes tenho falado…), cujo rosto primeiro é o do inefável Jorge Coelho e que se estende por tudo quanto é sítio, mesmo em órgãos de Comunicação Social que se presumiam insuspeitos. Já ninguém é insuspeito, em Portugal...

The last, but not the least, no Partido Social Democrata, Marques Mendes – aquele a quem deveriam caber (e cabem) as despesas maiores da Oposição, tão serena quanto consciente, mas sem tréguas e, sem dúvida alguma, indispensável para que o País não se torne numa coutada – não tem qualquer reacção visível a estes atropelos à verdade dos factos.

E não a tem porque ao seu padrinho, Aníbal António Cavaco Silva, aquele em relação ao qual correm por aí rumores de que não é quem manda no PSD (rumores que, pelo que consta também, disso mesmo não passam), não convém, de forma nenhuma, afrontar o eleitorado socialista, agora que - como é sabido e cada vez mais se torna evidente - as bases e os eleitorados social-democratas e democrata-cristãos se mostram muito pouco inclinadas a apoiá-lo na tentativa de dar boa concretização às pretensões políticas que alimenta de abrangente e pessoal hegemonia no País.

Posto tudo no são, pois, já que estes constituem, na minha perspectiva, os nomes que havia quer dar aos bois, mister é que estejamos atentos às peripécias que se avizinham e não nos deixemos ingloriamente engrolar.

Da minha parte, aqui fica um pequeno esforço, no sentido de alertar. Cada qual tomá-lo-á como melhor entenda. Fiz o que julgo ser meu dever. Está feito.

Ruben Valle Santos
24 Maio 2005
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