Monday, September 13, 2004

2. Textos d'ontem - "Portugal e os Portugueses"

Crónica de rádio – 26 Nov 1985

Portugal e os Portugueses

Olá, bom dia, caro ouvinte!

Nesta primeira vez que estou em contacto consigo, através das antenas desta excelente estação de rádio, gostaria de sugerir-lhe que, em conjunto, reflectíssemos um pouco sobre Portugal e os Portugueses.

Será reflexão muito sumária, dado o pouco tempo de que dispomos e talvez que esta não seja a hora mais propícia a grandes exercícios mentais, de raiz mais ou menos metafísica, porque a vida é dura e há que ganhá-la no quotidiano.

Mas reflictamos um pouco.

O que é Portugal? Quem são os Portugueses?

Um cronista mais apressado e inclinado ao uso de frases feitas diria que se trata de um “jardim à beira mar plantado”, povoado por gentes de “brandos costumes”. E ficaria provavelmente muito satisfeito com o achado. Só que… Pois é, só que muito ficaria por dizer. Precisamente o essencial.

É que esse tal jardim à beira mar plantado existe há mais de oitocentos anos e desde o seu nascimento soube afirmar-se de forma bem concludente entre os seus pares e estender a sua influência por todo o mundo. Foi até onde outros, de maiores recursos e aparentemente mais vocacionados, jamais se atreveram.

E essa gente de brandos costumes soube impor-se pela sua cordialidade, pelo seu intimorato espírito de aventura, pela incomparável capacidade de se miscigenar, dando e recebendo, num intercâmbio de culturas que só ela foi capaz de conceber, estabelecer e aprofundar.

Pequeno-grande país? Pequeno-grande povo?

Poderá parecer-lhe, caro ouvinte, um pouco estranha, talvez despropositada, esta crónica. Mas já pensou que a integridade de um país, a força do seu povo, jamais se perderão se esse povo for capaz de manter incólume e sempre presente a sua memória colectiva? E que nunca será demais reavivá-la?

Por vezes, com o fervilhar das preocupações quotidianas, temos tendência a privilegiar o acessório, esquecendo o essencial. É contra essa maré que devemos remar. Como contra as que tendem a levar-nos a menosprezar alguns valores que são perenes e dos quais jamais deveríamos afastar-nos.

Como país, como povo, passámos já por muitas dificuldades. Inúmeras vezes fomos postos à prova e assaltados pela dúvida. Em muitas ocasiões vimos em grande risco a nossa identidade nacional.

Soubemos sempre, todavia, arrostar com as dificuldades, vencê-las. Fomos sempre capazes de nos erguermos e de afirmar bem alto a nossa realidade. Por muito desesperada que fosse a situação, sempre nos mostrámos à altura e mantivemos acesa a chama da esperança. E vencemos, vencemos sempre! Os exemplos são incontáveis.

Não há, pois, razão para derrotismo, hoje que Portugal e os portugueses passam por mais um transe difícil. Há, sim, que confiar no povo que somos. Porque nós somos capazes! Em muitas coisas somos tão bons como os outros; em outras tantas, somos mesmo melhores.

Se o nosso destino colectivo não se apresenta ridente neste momento, não há que desesperar. Melhores dias virão. Continuemos a nossa luta. Todos juntos construiremos algo digno do povo que somos. Talvez mais cedo do que esperamos.

Há que manter a serenidade e que prosseguir o combate. Sem desfalecimentos. Portugal e os portugueses merecem-no. Nós merecemo-lo!

Bom dia!

Ruben Valle Santos